Uma reflexão sobre a legitimação da arte contemporânea

Por Roberta Ribeiro Prestes [1]

A arte contemporânea é muito questionada e problematizada. Além de não existir uma definição precisa para o que é arte, contemporaneidade tão pouco possui uma delimitação temporal precisa.
Enquanto há os que defendem uma arte mais clássica, dentro de antigos cânones, há os que afirmam a existência de uma arte mais “livre”, mais expressiva, sem tantos critérios estéticos.
Apesar de ter estudado um pouco de história da arte, ir a diversas exposições de arte contemporânea, e mesmo trabalhar em muitas bienais do MERCOSUL, eu sou a moda antiga, defendo a arte dentro de cânones, aquela que se legitima sozinha, que não precisa estar dentro de uma instituição para ser reconhecida como tal.
Em muitos momentos me perguntei o que era arte ou porque isso ou aquilo era uma obra. Entre as coisas que já fiz na minha vida, pintei por um longo período, e, da mesma forma que outras colegas minhas, perguntava pro meu professor o que me legitimava como pintora: uma exposição?, um curador?, um marchand?, ou ele? A resposta que minha turma de sextas pela manhã recebeu foi: vocês mesmas se legitimam a partir do momento que acreditam que são artistas e que seus trabalhos são obras de arte e não simples pinturas. Fim da história? Desisti de pintar, pois eu não acreditava que meus quadros eram obras “de verdade”.
O que eu quero dizer com isso tudo é que acreditamos que a legitimação tem que vir de uma instituição, da mesma forma que precisamos de um certificado que comprove nosso conhecimento numa língua estrangeira, mesmo que haja uma grande fluência.
Não vejo problema de uma obra ter que ser legitimada por algum cânone ou por instituições que a promovem, mas vejo problema na falta disto, de uma arte que acaba sendo “aceita” no circuito não por sua qualidade artística e sim porque o cara conhece o curador da exposição, ou coisas do gênero.
Enfim, deixando de lado o artista em si e voltando a obra propriamente dita, acredito que a arte hoje, muitas vezes quando sai do contexto da exposição ou do local onde a legitimamos como arte, perde todo o seu caráter. Lógico que terão os que lembrarão de Duchamp, mas apesar de hoje eu questionar obras como a que ele foi pioneiro, compreendo que naquele momento ele foi um gênio. Ele soube como criticar o que acontece até os dias de hoje com a obra de arte: a falta de critérios, de estética, de qualquer tipo de limite.
A liberdade criativa tem que existir sim, mas a estética, a justificativa e o estudo também, sem falar no profissionalismo. Acredito fielmente que hoje existem artistas comprometidos, que fazem coisas maravilhosas (e não estou me referindo a uma estética que me agrade visualmente, acho “horrorosos” os quadros do Iberê Camargo, por exemplo, mas reconheço como são “lindos” – espero que entendam o que disse), porém, tantos outros que estão ai expondo são imperdoáveis e não deveriam ser considerados artistas.
Daí, isso tudo me faz questionar qual é o público de arte contemporânea. Pois, se pararmos para pensar, cada vez mais é fechado para intelectuais e estudiosos da área porque as pessoas praticamente não tem o direito de simplesmente dizerem que gostaram ou não daquilo. Não podem criticar sem um conhecimento maior, mas ao mesmo tempo, como vão conhecer se é um campo tão fechado e que a cada dia mais e mais artistas surgem, sem nenhuma procedência, sem nenhum currículo e pior ainda, com pouco conteúdo.
A arte contemporânea, pra mim, se perdeu um pouco na tentativa de renovar, inovar e também de ser “popularizar” sem deixar de ser erudita. Cada vez mais se fala em aproximar as pessoas do museu, da arte, mas o que vejo acontecer é um processo de afastamento. Não há critérios, não há novidades e sobretudo não há beleza na arte, isso se perdeu e é isso que gostamos de ver. Os quadros de Picasso podem ter sido considerados horríveis no seu tempo e Van Gogh pode não ter sido compreendido, mas a beleza e a qualidade estética de ambos são inegáveis.
Hoje, a arte mais lança questionamentos, sobre sua legitimação, conteúdo e qualidade do que apresenta algo ao público. A partir do momento que consideramos que “qualquer um” pode ser artista em qualquer momento e que avaliamos “qualquer coisa” como obra de arte, todo o encantamento se perde.

[1] Licenciada, bacharel e mestre em História pela PUCRS, atualmente é aux adm de marketing do JC.

Nenhum comentário:

Postar um comentário